Objetivo:
Dom Pedro II e o início da pesquisa científica para a agropecuária no Brasil
A pesquisa agropecuária em terras brasileiras teve início no século XIX, ainda no Brasil Império. O Imperador Dom Pedro II incentivou, por meio de bolsas de estudos, que os brasileiros buscassem conhecimento nas universidades europeias, para posteriormente desenvolver as ciências no Brasil.
O Imperador era um homem das artes e das ciências. Ele usou seu prestígio para elevar a imagem do Brasil, que despontava como referência nas Américas. Isso era tão evidente que Charles Darwin declarou: “O imperador faz tanto pela ciência que todo sábio é obrigado a demonstrar a ele o mais completo respeito”.
Nos últimos anos do Império o Conselheiro Antônio da Silva Prado, Ministro da Agricultura, aconselhou Dom Pedro II a implantar no Brasil uma estação de pesquisa nos mesmos moldes das europeias.
*Fonte: Dicionário do Brasil Imperial, publicado em 2002. - PEDRO KARP VASQUEZ.
Em 1887, D. Pedro II criou a Estação Agronômica no município de Campinas, SP, com o intuito de aprimorar as ciências agronômicas, em especial a do café, a mais importante cultura do Estado de São Paulo e do Brasil, à época.
Em 1892 a Estação passou para a administração do Governo do Estado de São Paulo. Foi renomeada como Instituto Agronômico de Campinas, IAC. Teve, e continua tendo, uma atuação importante no desenvolvimento de pesquisas em alimentos, fibras e energia.
Hoje, com o nome de Instituto Agronômico, faz parte da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. O IAC possui pesquisadores nas áreas de fitotecnia (plantas) e zootecnia (animais), em todas as regiões do estado. São 12 centros de pesquisa nos municípios de Campinas (7), Cordeirópolis (1), Jundiaí (2), Ribeirão Preto (1) e Votuporanga (1).
Centros de pesquisa do IAC:
Ribeirão Preto sedia o Centro de Cana, onde está instalado o Programa Cana IAC, que é a interface da pesquisa com o setor sucroenergético. Lá são debatidas as demandas para o aprimoramento de linhas de pesquisas científicas. Uma equipe multidisciplinar de pesquisadores e técnicos trabalha no desenvolvimento de soluções para o setor, como variedades de cana e pacotes tecnológicos, que têm elevado a qualidade da canavicultura.
O Centro de Cana abriga um Banco de Germoplasma de onde são retirados materiais para importantes avanços no potencial biológico da cana. Os trabalhos envolvem sequenciamento de DNA, microscopia, diagnóstico molecular e expressão gênica, para citar alguns.
Por cinco séculos, desde a chegada da cana-de-açúcar no Brasil, o plantio vem sendo feito a partir de colmos de cana (onde ficam as gemas), plantados em sulcos, manualmente ou por máquinas. Com o desenvolvimento da Muda Pré Brotada (MPB) houve uma mudança conceitual na forma de plantar a cana. O sistema consiste em formar mudas a partir de minirrebolos (parte do colmo onde estão as gemas), com elevado padrão de fitossanidade e vigor. O sistema promove a redução da quantidade de cana usada para o plantio. No plantio convencional são necessárias de 18 a 20 toneladas de cana por hectare, e no sistema MPB, são necessárias 2 toneladas de cana para formar as mudas em tubetes.
Você Sabia?
O feijão Carioca, aquele muito popular no prato do brasileiro, foi desenvolvido pelo IAC/Apta, em São Paulo.
O feijão recebeu esse nome porque se parecia com porcos rústicos malhados, conhecidos como carioca. Foi uma revolução na cozinha brasileira, pois o feijão carioca era mais macio que os feijões da época, e cozinhava em tempo muito menor. A pesquisa sobre o feijão carioca nunca parou de evoluir, e já foram lançados 50 cultivares. Os avanços aconteceram, principalmente, em relação à produtividade e à qualidade nutricional do produto.
No Brasil, são muitas as instituições de pesquisas voltadas para o agro. Elas podem ser públicas ou privadas, ter vínculos com universidades brasileiras e internacionais, com governos municipais, estaduais e o federal. As instituições de pesquisa podem atuar isoladamente na busca de soluções para problemas locais, ou em grandes projetos de cooperação, para resolver problemas globais, como no caso de pandemias. Nessas circunstâncias são comuns as parcerias com organizações internacionais de Pesquisa & Desenvolvimento.
Muitas descobertas de pesquisas urbanas têm aplicação no campo, e vice versa. Não há limites para o alcance das ciências.
No Brasil os institutos estaduais de pesquisa, as universidades e as instituições privadas trazem, há mais de um século, grandes contribuições para a agropecuária. Mais recentemente surgiram as AgTechs, empresas de base tecnológica e de caráter inovador, as chamadas startups. Elas possuem em comum o DNA da inovação, e vieram para acelerar soluções para os problemas do agro moderno.
Como já foi visto, a ciência é essencial para superar obstáculos. Com esta premissa foi criada, em 1973, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Embrapa, que atualmente possui 43 centros de pesquisa em todas as regiões do país.
Em sua trajetória, a EMBRAPA foi responsável por superar as barreiras que limitavam a agricultura em região tropical. As pesquisas propiciaram inovações que permitiram tanto produzir em terras antes consideradas impróprias, como a região do Cerrado, quanto para adaptar algumas culturas ao Brasil, como a soja e o trigo. São inovações trabalhadas em temas estratégicos para o país, para responder às necessidades da nossa agropecuária.
Tecnologias no Agro
O Sistema de Plantio Direto surgiu da necessidade de combater e evitar a erosão no campo. Há mais de 30 anos prova ser uma prática importante, adaptada aos diferentes níveis tecnológicos e regiões. Neste sistema a superfície do solo é mantida coberta com resíduos de culturas anteriores (palha e/ou vegetação dessecada) utilizando-se muito menos etapas mecanizadas para o plantio. O resultado é o controle do escorrimento superficial da água da chuva, a menor compactação do solo, e a melhora da infiltração, o que reduz a ação erosiva. Como é empregado o cultivo mínimo, ou seja, não é feito o revolvimento com aração e gradagem, o carbono contido no solo fica retido, reduzindo a emissão de gases causadores de efeito estufa.
*O Plantio Direto é realizado em 50% da área de produção de grãos no Brasil, ou seja, em 33 milhões de hectares.
*Fonte: Federação Brasileira de Plantio Direto e Irrigação, 2018.
Esta prática consiste em alternar, em uma mesma área, diferentes espécies vegetais em determinado espaço de tempo e de forma ordenada. Daí o nome "Rotação de Culturas".
A rotação melhora as características físico-químicas do solo, pois cada cultura possui uma necessidade nutricional e um sistema radicular (raízes) diferentes, portanto cada espécie deixa um efeito residual positivo no solo disponível para a cultura sucessora. Essa rotação possui melhores resultados quando há alternância entre gramíneas e leguminosas.
Na região de Ribeirão Preto a rotação entre a cana-de-açúcar e outras culturas acontece desde os anos 1970. Começou com a Coplana, Cooperativa dos Produtores de Cana de Guariba, que utilizou uma planta pouco conhecida por aqui à época, a soja.
A cada final de ciclo da cana-de-açúcar, que em média acontece depois de 6 safras, ocorre queda da produtividade e é necessário renovar o canavial. Neste momento, muitos produtores optam pela rotação de culturas, intercalando após a colheita da cana, que é uma gramínea, o plantio de uma leguminosa, sendo que as mais comuns na região são a soja, o feijão e o amendoim, e o girassol, que é uma oleaginosa. Após a colheita dos grãos, a cana é plantada novamente. Essa prática melhora a qualidade nutricional e a porosidade do solo, e, consequentemente, a produtividade da nova safra de cana-de-açúcar.
Além dos pontos positivos apresentados, a rotação de cultura permite que mais alimentos sejam produzidos em áreas ocupadas com canaviais, e destinadas à produção de açúcar, que também é um alimento, e de etanol e bioeletricidade, energias limpas e renováveis.
Biotecnologia
Segundo a Convenção sobre Diversidade Biológica, tratado internacional da ONU sobre proteção e uso da diversidade biológica dos países signatários, BIOTECNOLOGIA significa: “Qualquer aplicação tecnológica que utilize sistemas biológicos, organismos vivos, ou seus derivados, para fabricar ou modificar produtos ou processos para usos específicos”.
Principais usos da Biotecnologia:
Na agricultura:
Melhoramento genético de plantas e animais, organismos geneticamente modificados (OGM ou transgênicos), fertilizantes, agroquímicos, etc.
Nos alimentos:
Biofortificação, conservação, introdução de compostos funcionais (exemplos: antioxidantes, antiinflamatórios, nutricionais) etc.
Na indústria:
Enzimas, biossensores, biocombustíveis, tecidos, biocatalizadores, etc.
Nos medicamentos:
Insulinas, hormônios, antibióticos, vacinas, etc.
No meio ambiente:
Purificação de água, tratamento de resíduos sólidos e líquidos, esgoto, lixo, etc.
Transgênico é sinônimo para a expressão "Organismo Geneticamente Modificado" (OGM). É um organismo que recebeu um gene de outro organismo doador. A transgenia difere do melhoramento genético convencional, pois permite transferir características específicas entre espécies diferentes. Com ela os cientistas podem isolar genes de microrganismos, por exemplo, e transferi-los para plantas. Dessa maneira, ela passa a ter, a partir da alteração do seu DNA, uma característica que não tinha antes.
Na agricultura, a transgenia pode contribuir para o aumento da produtividade (produzir mais em menos área) e para a diminuição do uso de agroquímicos. A ciência vem permitindo a introdução de outras características desejadas, como: resistência à seca, às pragas e doenças; tolerância a herbicidas, inseticidas e outros agroquímicos. Outros exemplos de usos da ciência são o desenvolvimento de alimentos funcionais, por exemplo com mais fibras, proteínas, e vitaminas, e de medicamentos.
Fonte: Embrapa
O feijão, por exemplo, alimento muito presente na mesa do brasileiro, é amplamente afetado por um vírus chamado mosaico dourado, capaz de causar perdas de até 100% nas lavouras. Para solucionar esse problema, pesquisadores da Embrapa fizeram uso de engenharia genética, para desenvolver um método baseado na introdução de fragmentos do vírus na planta de feijão. Dessa forma é ativado o sistema imunológico, e a planta fica imune ao mosaico dourado. Esse método é muito parecido ao uso de vacinas para prevenção de doenças em seres humanos.
A tecnologia empregada no desenvolvimento de medicamentos tem muitas vertentes. Uma pesquisa com sementes de soja, por exemplo, foi baseada na introdução da cianovirina, uma proteína presente em algas, que é capaz de impedir a multiplicação do vírus HIV no corpo humano. Os estudos com as sementes de soja, geneticamente modificadas, comprovaram a eficácia da cultura para a produção, em larga escala, dessa proteína. O trabalho, realizado em parceria entre a Embrapa e instituições internacionais, foi tema de artigo na revista Science em 2015, e recebeu premiações internacionais em 2017 e 2018.
A produção de transgênicos é uma atividade legal e legítima, regida por legislação específica e pautada por rígidos critérios de biossegurança. Um produto geneticamente modificado só pode ser comercializado se estiver de acordo com a Lei de Biossegurança (Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005), e uma das mais rigorosas do mundo. A lei regula por inteiro a cadeia produtiva, cobrindo, desde a construção, experimentação, cultivo, manipulação, transporte, comercialização, consumo, armazenamento, liberação no meio ambiente até o descarte de organismos geneticamente modificados (OGM) e derivados. Somente depois de analisado e aprovado pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, o produto vai para o mercado. Este processo pode levar até 10 anos de pesquisa.
É um conjunto de atividades ou mecanismos de alta tecnologia que ocorrem em uma escala extremamente pequena, além da percepção dos olhos humanos, chamada nanométrica (um nanômetro é a bilionésima parte de um metro).
A nanotecnologia é amplamente utilizada na fabricação de semicondutores e circuitos integrados - chips. Ela ajudou a diminuir o tamanho dos computadores, celulares, e está presente em medicamentos e produtos de beleza. Um bom exemplo são os filtros solares, que por meio de nanopartículas ganham atributos de maior resistência, proteção e durabilidade sobre a pele.
No agronegócio, a nanotecnologia está presente em diversas áreas. É tão estratégica que deu origem à criação da Rede AgroNano, da qual participam mais de 150 pesquisadores, especialistas em física, química, bioquímica, biologia, agronomia, zootecnia e engenharias. A Rede está fazendo ciência e tecnologia de qualidade, em perfeita conexão às necessidades do homem. Esses cientistas pertencem a universidades e unidades da Embrapa sediadas em todas as regiões brasileiras. A Rede AgroNano congrega linhas de pesquisa, promove maior intercâmbio de ideias, e favorece o desenvolvimento regional equilibrado. O intenso trabalho técnico está focado no desenvolvimento de sensores, biossensores, filmes finos comestíveis e membranas, biopolímeros, nanopartículas de origem natural, embalagens funcionais para alimentos, sistemas de liberação controlada, entre outros.
O nanofilme comestível ajuda a preservar a qualidade dos alimentos, e prolonga o tempo em que pode ser consumido, mantendo as características nutricionais. Ainda não está disponível comercialmente, mas em breve será um grande aliado para aumentar a durabilidade de frutas e legumes nas quitandas, supermercados e nas casas dos consumidores, ajudando a combater o desperdício de alimentos, um assunto que merece a atenção de toda a humanidade.
A Língua Eletrônica é um exemplo desses sensores. Ela pode, entre outras funções, auxiliar o trabalho de enólogos, ou de baristas, na classificação de vinhos e cafés, respectivamente. E pode ainda detectar a contaminação de alimentos e da água.
Agricultura de Precisão
A Agricultura de Precisão é um conjunto de boas práticas que emprega alta tecnologia para tornar a atividade mais racional e produtiva.
As teorias sobre agricultura de precisão surgiram no final década de 1920, nos Estados Unidos. Mas foi só a partir dos anos 1980 que elas se tornaram aplicáveis, graças aos avanços dos sistemas de geolocalização e à coleta eletrônica de dados.
A agricultura de precisão possibilita o monitoramento e a otimização da gestão da propriedade rural, sempre no sentido de oferecer informações para orientar e potencializar a produtividade, com reflexos positivos na preservação do meio ambiente. Isso se deve à maior assertividade das decisões, o que permite alcançar melhores resultados em todos os aspectos. Todo esse gerenciamento e controle podem ser feitos por meio de sistemas integrados de georreferenciamento, utilização de softwares e hardwares de alta tecnologia, mas dependem de uma boa interpretação dos dados levantados, de modo que a inteligência e o conhecimento humano continuam sendo vitais em todo esse processo.
Se no princípio a agricultura de precisão era limitada à mecanização de processos, com a incorporação dos computadores de bordo, atualmente ela alcançou outro patamar.
Já é possível gerar e cruzar informações de mapas de fertilidade de solos, com o de produtividade no momento da colheita, e calcular, por metro quadrado, a necessidade de adição de adubos e corretivos a serem aplicados para a safra seguinte.
Da mesma maneira, muitas outras funcionalidades e alertas são oferecidos em tempo real. Com essas informações as operações de plantio, dos tratos culturais e da colheita passaram a ser mais precisas. Fertilizantes e defensivos são aplicados em taxas variáveis, precisamente, no local e na quantidade necessária. Isso contribui para a sustentabilidade do setor, pois reduz não apenas os custos, como também eventuais impactos negativos ao meio ambiente e à saúde dos operadores.
Uma realidade que não está distante são as máquinas sem operadores, e a troca de informações entre elas, para a tomada de decisão. É a chamada Internet das Coisas, IoT, Internet of Things, ou seja, quando existe a interconexão e a capacidade de trocar dados entre as máquinas, e com outros dispositivos e sistemas, via Internet. Mas tudo isso depende da conectividade no campo, um grande desafio a ser vencido. Atualmente menos de 30% das propriedades rurais possuem acesso à internet. Alternativas para a conectividade no campo, via satélite e rádio estão sendo desenvolvidas.
Essas tecnologias são capazes de gerar e processar um grande volume de dados, que servem de base para a gestão do negócio, tanto no campo quanto nas cidades. Em futuro próximo, máquinas e equipamentos poderão ser programadas para que atuem, em determinadas circunstâncias, sem a interferência direta do homem na operação. Isso poderá acontecer nas fazendas, por exemplo, quando as máquinas serão acionadas “sozinhas”, no momento certo, e farão a aplicação da quantidade certa de um produto qualquer em uma determinada área, e voltarão para o galpão. O mesmo poderá acontecer nas casas, nos centros urbanos. Ao perceber a chegada do morador, as luzes se acendem, o portão se abre, a cafeteira prepara o café, a máquina de lavar é acionada, o ar condicionado e a televisão são ligados, etc. Pode parecer assustador, mas sempre dependerá de uma programação prévia, feita por um ser humano, que será sempre o responsável por esse fantástico mundo novo.